BRASILEIROS ESTÃO PREOCUPADOS COM A DESINFORMAÇÃO
Por Ana Regina Rêgo
O Relatório de Mídia Digital 2021 realizado pelo Institute Reuters em parceria com a University of Oxford em seis continentes e 46 países aponta algumas questões importantes sobre o fenômeno da desinformação nas plataformas digitais/mídias sociais e mídia em geral, dentre elas, a de que a preocupação com a desinformação vem crescendo entre as populações dos países observados (agora 58% dos entrevistados se dizem preocupados), embora não de modo equânime; mesmo assim, o aflorar de tal preocupação nas sociedades nos abre uma janela de esperança no combate ao mercado das informações falsas que tem atuado na construção e/ou manutenção da ignorância coletiva de modo intencional e influenciado nos rumos das democracias, por um lado, enquanto que por outro, tem levado pessoas à morte, neste momento de pandemia da COVID-19.
O documento contextualiza a crise econômica e de credibilidade que tem atingido o jornalismo e aponta que apesar disto, o jornalismo tem encontrado novas formas de relacionamento com a sociedade tendo em vista, que durante a pandemia da novo coronavírus o acesso a informações confiáveis tem sido vital, inclusive, para a sobrevivência.
Dentre as principais conclusões da pesquisa aqui em pauta, vale destacar a constatação de que a confiança nas notícias aumentou, em média, seis pontos percentuais na esteira da pandemia do novo coronavírus – com 44% dos entrevistados afirmando que confia na maioria das notícias na maior parte do tempo. Isso reverte, em certa medida, as quedas recentes na confiança média – trazendo os níveis de volta aos de 2018. A Finlândia continua a ser o país com os níveis mais altos de confiança geral (65%), e os EUA agora têm os níveis mais baixos (29%). Por outro lado, a confiança nas notícias das redes sociais e de pesquisa permaneceu amplamente estável. Isso significa que a lacuna de confiança entre as notícias em geral e aquelas encontradas em ambientes agregados aumentou – com o público aparentemente dando mais valor a fontes de notícias precisas e confiáveis.
Segundo os investigadores, os noticiários televisivos continuaram a ter um forte desempenho em alguns países, mas os jornais impressos experimentaram um declínio ainda mais acentuado em quase todos os lugares, à medida que os bloqueios afetavam a distribuição física, acelerando a mudança para um futuro principalmente digital.
Em meio a esse processo de aproximação das pessoas com a informação e de desenvolvimento de efetivo engajamento, a pesquisa também detectou que embora muitos permaneçam muito engajados, encontramos sinais de que outros estão se afastando da mídia e, em alguns casos, evitando as notícias. O interesse pelas notícias caiu drasticamente nos Estados Unidos após a eleição do presidente Biden – especialmente entre grupos de direita. Isso também pode ser sentido no Brasil no atual momento, em que antigos apoiadores do atual governo estão em silêncio, ou, porque estão sofrendo da espiral do silêncio numa alusão aqui a hipótese de Elizabeth Noelle-Neumann, ou porque estão efetivamente decepcionados.
No que concerne ao uso de mídias sociais para acesso a notícias, vale destacar que o mesmo continua forte, especialmente entre os mais jovens e com níveis de escolaridade mais baixos. Aplicativos de mensagens como WhatsApp e Telegram se tornaram especialmente populares no Sul Global, criando a maior preocupação quando se trata de espalhar desinformação sobre o novo coronavírus.
Já no tocante à preocupação com a desinformação é válido destacar que a pesquisa indica um aumento em nível global, sendo as informações falsas e enganosas foco de grande preocupação em países como o Brasil, onde 82% dos entrevistados se dizem preocupados. Por outro lado, em países como a Alemanha em que o nível educacional, cultural e crítico é mais elevado, apenas 37% estão preocupados. Aqueles que usam a mídia social são mais propensos a dizer que foram expostos a informações incorretas sobre o Coronavírus do que os não usuários. O Facebook é visto como o principal canal de divulgação de informações falsas em quase todos os lugares, mas aplicativos de mensagens como o WhatsApp são vistos como um problema maior em partes do Sul Global, como Brasil e Indonésia.
É bom que se ressalte que no caso brasileiro, o nível de preocupação é mais do que justificado tendo em vista que o fenômeno da desinformação que se estrutura em um ecossistema que por sua vez, abriga um grande e lucrativo mercado tem se especializado e crescido exponencialmente e se “aliado” ao novo coronavírus levando mais de meio milhão de brasileiros à morte. Vale lembrar ainda que segundo uma pesquisa da Kaspersky de 2019, 62% dos brasileiros não sabem discernir entre uma informação e uma narrativa desinformacional.
Por outro lado, esse índice de preocupação reflete ainda o crescimento da consciência crítica da população que tem a seu lado milhares de iniciativas de norte a sul do país que trabalham diuturnamente no combate à desinformação. Destaco a nossa Rede Nacional de Combate à desinformação-RNCd Brasil ( www.rncd.org) que hoje reúne cerca de 120 parceiros de quase todos os estados brasileiros, dentre outras grandes iniciativas que nos ajudam nesse momento difícil.
A pesquisa do Institute Reuters em parceria com Oxford também sinaliza que embora os dados apontem que as principais marcas de notícias e jornalistas atraem mais atenção em torno das notícias no Facebook e no Twitter, elas são eclipsadas por influenciadores e fontes alternativas em redes como TikTok, Snapchat e Instagram, o que potencializa a preocupação visto que digital influencers, são muitas vezes falas de si interessadas em visibilidade e lucratividade, não apresentando compromisso com os acontecimentos ou evidências. A TikTok agora atinge um quarto (24%) dos menores de 35 anos, com 7% usando a plataforma de notícias – e uma penetração maior em partes da América Latina e da Ásia.
Já o acesso às notícias encontra-se bem distribuído. Em todos os mercados, apenas um quarto (25%) prefere começar suas jornadas de notícias com um site ou aplicativo. Aqueles com idades entre 18 e 24 anos (a chamada Geração Z) têm uma conexão ainda mais fraca com sites e aplicativos e são quase duas vezes mais propensos a preferir acessar notícias via mídia social, agregadores ou alertas móveis. Por outro lado, os meios de acesso são potencialmente móveis, o uso de smartphone para notícias (73%) cresceu em sua taxa mais rápida em muitos anos, com a dependência também crescendo por meio de bloqueios de Coronavírus. O uso de laptops, desktops e tablets para notícias está estável ou em queda, enquanto a penetração de alto-falantes inteligentes permanece limitada na maioria dos países – especialmente para notícias.
Para ler o Relatório na íntegra acesse: https://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/digital-news-report/2021/dnr-executive-summary