Circula áudio no whatsapp com falsas alegações sobre a COVID-19, vacinas e medidas de distanciamento social
Áudio foi produzido por Marcelo Frazão, candidato à Prefeitura de São Simão (SP)
Recebemos, por meio de parceria com o aplicativo Eu Fiscalizo da Fiocruz (disponível para Android e iOS), um áudio que circula no whatsapp com falsas afirmações acerca da pandemia de COVID-19. A mensagem é de autoria do candidato à Prefeitura de São Simão, localizada na região de Ribeiro Preto (SP), Marcelo Frazão.
Entre as alegações pontuadas no áudio, o também suposto médico diz que o “vírus não mata ninguém”, ou seja, não há mortes por COVID-19 no mundo. Contudo, até o momento de redação desta matéria, a pandemia já vitimou 1.532.418 pessoas em todo mundo, segundo informação da Organização Mundial de Saúde (OMS). Outras afirmações levantadas por Marcelo Frazão no áudio é que atualmente a OMS defende o fim do isolamento social, a ineficácia no uso de máscaras e a alteração no código genético, podendo desencadear até a homossexualidade.
Com informações da Agência Lupa, apesar de usar o título de doutor, ele não é médico. Para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a profissão declarada foi de engenheiro. Além disso, não foi encontrado registro profissional no Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), tampouco consta, na plataforma Lattes, currículo em seu nome, que comprove a sua titularidade acadêmica.
A Agência Lupa ainda entrou em contato por telefone com Frazão para verificar a autoria do áudio, o que foi confirmado por ele. Perguntado sobre onde seria possível encontrar documentos que comprovem as suas afirmações, disse que elas poderiam ser comprovadas pelo “Partido Comunista Chinês”. Frazão irritou-se quando foi questionado sobre a sua titularidade de “doutor” e xingou o repórter do veículo de comunicação.
“Vírus que não mata, homossexualidade e fracasso do distanciamento social” – Além de indicar que não houve mortes pelo novo coronavírus, no áudio também é dito: “Nunca ninguém morreu nesse mundo por causa de um resfriado e ninguém morre de resfriado nesse mundo”. No entanto, a afirmação é falsa.
Diferentes síndromes virais, como a influenza (gripe), sarampo, poliomielite e até mesmo a COVID-19 podem ocasionar óbito. De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), a influenza sazonal, também conhecida como gripe, é uma doença que pode levar a sérias complicações que exigem hospitalização e podem até causar a morte. As pessoas frequentemente não reconhecem sua gravidade, confundindo-a com resfriados, mas a cada ano cerca de 772 mil pessoas são hospitalizadas e entre 41 mil e 72 mil morrem em consequência da doença na Região das Américas.
Mesmo apresentando sintomas semelhantes a uma gripe ou resfriado, a COVID-19 não é a mesma coisa que as condições médicas aqui citadas. A OPAS preparou também um artigo que diferencia a gripe da COVID-19. Confira um fragmento:
O novo coronavírus, que causa a COVID-19, e os vírus que causam gripe são semelhantes. Ambos causam doenças respiratórias, que podem ser assintomáticas ou leves, mas também podem evoluir para casos graves e morte. Além disso, ambos os vírus são transmitidos por meio de contato ou gotículas. Como resultado, as mesmas medidas de saúde pública, como higiene das mãos e boa etiqueta respiratória (cobrir boca com cotovelo flexionado ou lenço descartável ao espirrar e tossir), são ações importantes que todas as pessoas podem adotar para prevenir ambas as infecções.
Sobre a informação da defesa pelo fim do isolamento social, segundo a Agência Lupa, a OMS não se posicionou em concordância às declarações do presidente Jair Bolsonaro. Esse boato teve início em 31 de março, quando Bolsonaro citou, em discurso a jornalistas e apoiadores, um tuíte do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em que ele chamava os governos a assumirem políticas de socorro às populações mais vulneráveis, para afirmar que os trabalhadores informais poderiam retornar às suas atividades. No dia seguinte, Ghebreyesus destacou em seu discurso para a imprensa internacional que a sua intenção foi salientar a importância de os governos adotarem medidas de apoio social durante o período de isolamento.
No dia 26 de novembro, o diretor-geral da OMS voltou a reforçar a necessidade das medidas de prevenção à Covid-19. Ele afirmou que é possível retornar às atividades escolares e econômicas e reconheceu que as pessoas já não querem mais lockdown. Destacou, contudo, que, para evitá-lo, é preciso que todas as pessoas façam a sua parte na contenção do vírus, inclusive mantendo-se em casa, se for possível. “Você deve continuar mantendo o distanciamento físico, usando máscaras, lavando as suas mãos regularmente, tossindo longe das pessoas, evitando aglomerações ou encontrando amigos e familiares em locais abertos”, frisou.
A OMS jamais defendeu a tese de que o vírus não provoca a morte das pessoas. Em seu site oficial, é possível encontrar uma seção em que são descritos os sintomas da doença provocada pelo coronavírus. No texto a seguir é exposto que, em casos graves, os pacientes podem vir a óbito. Além disso, em outubro, a organização publicou documento que alerta para a segunda onda de infecções no mundo e reafirma a necessidade de os Estados se organizarem de modo a garantir a testagem em massa e o pronto atendimento de saúde.
Quanto aos falsos argumentos que as vacinas modificam o material genético, podendo levar a homossexualidade, o Projeto Comprova entrou em contato com Cristina Bonorino, professora da UFCSPA e membro da Sociedade Brasileira de Imunologia. Em consonância com a pesquisadora, as afirmações do no áudio são mentirosas e perigosas. “Para alterar o código genético, você precisa de algo que se insira no seu DNA, e a gente sabe que as vacinas não vão fazer isso”, diz. Especificamente sobre a Coronavac, citada no áudio, Cristina afirma que ela usa o vírus inativado, ou seja, “não tem possibilidade nenhuma de alterar o código genético”.
Questionada sobre a afirmação de Frazão, de que “menino vai deixar de ser menino e virar menina”, a especialista respondeu: “Bom, hoje em dia o pessoal fala que a Terra é plana, né? Mesmo com evidências de que não é. Então, isso fica muito difícil de rebater… É uma afirmação completamente mentirosa”.
Discutido em outros momentos aqui no Nujoc Checagem, os argumentos contra o isolamento social e o uso de máscara são infindáveis. Recomendado pela OMS desde que a COVID-19 se tornou uma pandemia e também como uma medida não farmacológica, em decorrência da ausência de um tratamento com medicamento específico, o isolamento social tem salvado vidas.
Com informações do G1, pesquisadores da Unicamp calcularam quantas vidas o isolamento social está salvando. Eles consideraram as taxas de transmissão do novo coronavírus, ou seja, para quantas pessoas cada doente transmite o vírus.
Antes das medidas de isolamento social, essa taxa era de 2,15. Cada infectado passava o vírus para mais de duas pessoas. Em maio, a taxa já era de 1,59. Com esses dados, os pesquisadores estimaram quantos poderiam ser os casos de Covid-19 se não fossem as medidas de isolamento.
Enquanto isso, em estudo publicado em junho a estimava era que 3 milhões de vidas foram salvas na Europa devido às medidas de isolamento social.
Por último, sobre o uso de máscaras, a OMS passou a recomendar o uso de máscaras pelo público geral a partir do dia 05 de junho. Na entrevista coletiva em que foi realizado o anúncio da mudança na recomendação, o órgão explicou que a decisão veio da conclusão de novos estudos que apontavam a eficiência das máscaras como parte da estratégia para o controle do espraiamento da doença. Na mesma data, a OMS ainda publicou documento que reúne essas conclusões e indica como usar corretamente a proteção facial em diferentes ambientes e situações. O documento expõe 80 referências, que reúnem pesquisas conduzidas pelo próprio órgão e por pesquisadores de centros de pesquisa de diversos países.
No site da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS-OMS), há uma publicação de 09 de junho que aponta a importância do uso de máscara, além do uso por profissionais da área de saúde, pessoas com comorbidades, idosos e público em geral. O texto na íntegra, você pode ver aqui.