As diferenças abismais entre as vacinas de Oxford, Pfizer e Moderna, a Coronavac e a Sputnik V
Publicado originalmente em El País por Manuel Asende, Artur Galhocha e Regiane Oliveira. Para acessar, clique aqui.
As candidatas mais avançadas a imunizações contra a covid-19 se distinguem em fatores como preço, que varia de 19 a 135 reais por dose, temperatura de conservação e eficácia
A humanidade conseguiu em pouco mais de 10 meses desenvolver três vacinas experimentais com uma aparente altíssima eficácia contra o novo coronavírus. As mais promissoras são: Oxford-AstraZeneca, Pfizer-BioNtech e Moderna-Institutos Nacionais da Saúde dos EUA, mas cada uma delas tem suas vantagens e inconvenientes. Ainda se aguarda com muita expectativa os resultados de duas outras vacinas: da Sinovac (Coronavac), previsto para o início de dezembro, e a do Instituto Gamaleya (Sputnik V). Estas são as principais diferenças conhecidas até o momento entre estes laboratórios.
Preço
A grande maioria da humanidade precisará se vacinar contra a covid-19, de modo que o preço da injeção é um dos fatores essenciais para que o medicamento seja acessível a todos. As diferenças entre as três vacinas mais avançadas são abismais: a desenvolvida pelas britânicas Universidade de Oxford e AstraZeneca custará três euros (cerca de 19 reais) por dose; a da multinacional norte-americana Pfizer e a empresa biotecnológica alemã BioNTech superaria os 15 euros (96 reais) por dose, cinco vezes mais; e a concebida pela empresa norte-americana Moderna e os Institutos Nacionais da Saúde dos EUA chegaria a 21 euros (135 reais) por dose, sete vezes mais do que a de Oxford.
Esses preços estimados têm como base valores divulgados pelas empresas para países desenvolvidos e podem variar em caso de países em desenvolvimento, como o Brasil, e também para países mais pobres. O laboratório chinês Sinovac ainda não divulgou o valor de venda de sua vacina Coronavac. Em seu perfil no Twitter, a russa Sputnik V divulgou que seu preço será de menos de 20 dólares (cerca de 107 reais) por pessoa nos mercados internacionais. Para os cidadãos russos, a vacina será gratuita.
Temperatura de conservação
Levar as vacinas contra a covid-19 a todos os cantos do mundo será um desafio logístico com poucos precedentes. Um dos pontos decisivos será a temperatura de conservação de cada produto. A Universidade de Oxford se vangloriou em um comunicado de que sua vacina experimental se mantém na geladeira, entre temperaturas de 2 a 8 graus e, portanto, pode ser distribuída utilizando os canais já existentes para outras vacinas. A imunização da Pfizer, entretanto, precisa de temperaturas ultrafrias, de 70 graus abaixo de zero, um problema que a empresa tentará solucionar com contêineres com gelo seco que podem conservar a vacina durante 15 dias. O produto da Moderna está em um termo médio. Sua vacina experimental permanece estável por pelo menos seis meses a 20 graus abaixo de zero e aguenta 30 dias na geladeira, com temperaturas de 2 a 8 graus.
Um pesquisador da Sinovac envolvido no estudo Coronavac, disse à agência Reuters que a vacina pode ser uma opção atraente porque também pode ser armazenada em temperaturas normais de geladeira de 2 a 8 graus Celsius e pode permanecer estável por até três anos. Dados preliminares do Instituto Gamaleya mostram que a Sputnik V deve ser armazenada a menos 18 graus. No entanto, a empresa testa um processo de liofilização, um tipo de desidratação da vacina, que, assim, poderá ser armazenada em temperaturas normais de geladeira.
Eficácia
As equipes das vacinas experimentais proclamaram eficácias de 90% a 97%, mas há matizes entre elas. A Universidade de Oxford e a AstraZeneca anunciaram nesta segunda-feira uma eficácia de até 90% a partir de uma análise de 2.700 pessoas que receberam primeiro meia dose e após um mês uma dose completa. Com duas doses inteiras a eficácia, paradoxalmente, se reduz a 62%, de acordo com os resultados de um estudo maior, com 8.900 participantes. Os pais da vacina estão estudando esse fenômeno e será preciso ver se a eficácia preliminar de 90% se mantém nos resultados finais do teste clínico, que já recrutou 24.000 pessoas no Reino Unido, Brasil e África do Sul.
A vacina experimental da Pfizer e da BioNTech foi a primeira a oferecer um número de eficácia ? 95% ? com plena validade estatística, graças a um ensaio com 44.000 participantes e 170 contágios entre eles. Somente oito das pessoas infectadas receberam duas doses da vacina real. O restante, 162 voluntários, recebeu duas injeções de água com sais (placebo). A eficácia de 95% se mantém constante nos diferentes grupos de idade e em todos os sexos e raças dos participantes no ensaio, como destacou a Pfizer.
A empresa norte-americana Moderna e os Institutos Nacionais da Saúde, por sua vez, anunciaram uma eficácia de 94,5%, de acordo com uma primeira análise de um ensaio com 30.000 pessoas nos EUA. Seus resultados ainda são preliminares. Está previsto que nos próximos dias novos dados se somem a esses e se alcance a potência estatística suficiente para confirmar o número ou matizá-lo.
Os primeiros dados da Coronavac mostram que ela é segura e capaz de produzir resposta imune no organismo 28 dias após sua aplicação em 97% dos casos. Os resultados finais das pesquisas da chinesa Sinovac são aguardados para o início de dezembro. A vacina russa Sputnik V demonstrou, 42 dias após a primeira dose, uma eficácia de mais de 95%, divulgaram nesta terça o Instituto Gamaleya e o Fundo Russo de Investimento Direto (RDIF). De acordo com dados preliminares da segunda análise, a eficácia da vacina russa após 28 dias é de 91,4%.
Doses compradas pelo Brasil
O Governo brasileiro anunciou em agosto a abertura de um crédito extraordinário de 1,9 bilhão de reais para a produção e aquisição de 100 milhões de doses da vacina Oxford-AstraZeneca. A medida também prevê a transferência de tecnologia ao país caso a vacina se mostre eficaz e segura. A absorção da tecnologia será feita pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o processamento da vacina pela Bio-Manguinhos. Dados recentes sobre os resultados da eficácia da vacina mostram que o país pode ganhar 30% a mais de doses. Isto porque diferenças nos testes mostram que com uma dose reduzida e uma completa, em um intervalo de 30 dias, a eficácia da vacina é de 90%. “Em vez de termos vacina para 100 milhões de brasileiros, poderíamos vacinar 130 milhões. O que é um ganho adicional. Foi uma boa notícia”, disse Marco Krieger, vice-presidente de produção e inovação em saúde da Fiocruz, à Agência Brasil. A previsão é que a produção da vacina no Brasil tenha início a partir de dezembro deste ano.
O Governo do Estado de São Paulo assinou um acordo para a compra de 46 milhões de doses da vacina da Coronavac. As primeiras 6 milhões de doses chegarão prontas da China ? 120.000 doses já estão em São Paulo prontas para serem aplicadas após a autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O Intituto Butantan passará a produzir as imunizações no Brasil após a reforma de sua fábrica que está recebendo investimentos da ordem de 160 milhões de reais. Após o Ministério da Saúde voltar atrás no anuncio de compra de mais 46 milhões de doses da vacina do laboratório chinês, o governador do Estado, João Doria, afirmou que pode garantir a compra de 100 milhões de doses, mesmo sem verba federal.
O Ministério da Saúde aderiu a iniciativa Covax Facility, liderada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que irá permitir ao país acesso a pelo menos nove vacinas em desenvolvimento. Pelo acordo, o país tem direito a uma reserva de 40 milhões de doses. O Governo pretende divulgar um calendário de vacinação contra a covid-19 para 2021 e para isso está se reunindo com cinco farmacêuticas ? Pfizer, Moderna, Janssen-Cilag (braço da Johnson & Johnson), a indiana Bharat Biotech e o Fundo Russo de Investimento Direto (RDIF).
A farmacêutica União Química informou que assinou acordo com o RDIF para produzir a vacina Sputnik V no Brasil, segundo a Reuters. A empresa disse que firmou um acordo de confidencialidade que a impede de fornecer quaisquer detalhes técnicos ou científicos. O laboratório ainda precisa obter aprovação da Anvisa para a produção.