Dióxido de Cloro é eficiente no tratamento à COVID-19?
Nas redes sociais é propagada a mensagem que o uso de dióxido de cloro auxilia e chega a curar pacientes com COVID-19
Recebemos, por meio de parceria com o aplicativo Eu Fiscalizo da Fiocruz (disponível para Android e iOS), uma mensagem que circula nas redes sociais sobre a eficácia na administração do dióxido de cloro no tratamento à COVID-19. A postagem, localizada no grupo do facebook “Vacinas: o maior crime da história”, traz afirmações de “100% de sucesso” nos testes realizados com a substância, como também questiona a não aprovação e comercialização no combate à COVID-19 por parte da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Mencionado na postagem como MMS, segundo informações do Portal Dráuzio Varella, a sigla vem de Mineral Miracle Solution (solução mineral milagrosa, em tradução livre), substância vendida como medicamento, mas que é muito parecida com a água sanitária usada como alvejante.
A solução é composta por clorito de sódio 28% e um ativador, em geral ácido clorídrico 4%. Juntos, eles formam o dióxido de cloro, muito usado pela indústria de celulose para descolorir a polpa da madeira para fazer papel.
O produto foi criado pelo americano Jim Humble, ex-membro da Cientologia e fundador de uma igreja, o produto já é conhecido desde o fim da década de 1990. O americano alega ter curado amigos garimpeiros que pegaram malária e a partir daí utilizado a solução para tratar diferentes tipos de câncer, aids, hepatite, trombose, autismo, entre outras doenças.
No entanto, a substância não possui eficácia científica comprova, as alegações levantadas como um remédio milagroso são, portanto, falsas.
“O dióxido de cloro é a base para produção para muitos produtos de limpeza, como desinfetantes, produtos que usamos para limpar a casa, banheiros. Não pode ser consumido de forma alguma como medicamente por ser tóxico. É a mesma coisa que pegar um produto de limpeza e beber, fazer nebulização. A própria Anvisa já percebeu esse movimento de venda de produtos à base de dióxido de cloro com apelo de que trataria o coronavírus e foi à caça desses sites para tirá-los do ar e processar quem anuncia esses produtos”, afirma o pneumologista Rodolfo Fred Behrsin, professor do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle ao G1.
Outra médica também consultada na mesma matéria do G1, Ingrid Cotta, infectologista da Beneficência Portuguesa de São Paulo, reforça que o indivíduo que fizer uso dessa substância pode vir a apresentar insuficiência respiratória grave. “O dióxido de cloro é uma substância química usada para tratamento de água e clareamento de superfícies. Não deve ser usada em seres humanos”, avisa.
“Até hoje não existe comprovação científica de utilidade para tratamento de qualquer doença em humanos, o que vale para a Covid-19. Além disso, quem usar o dióxido de cloro, seja em qualquer dose, corre risco de evoluir com perigosos efeitos colaterais, hepáticos, hematológicos. O uso pode levar a quadros de insuficiência respiratória bastante graves”, diz Ingrid.
A médica recorda que em maio do ano passado a Anvisa liderou uma ação coordenada com estados e municípios no sentido de inibir o comércio irregular e fiscalizar a fabricação do MMS, tamanho é o risco para as pessoas iludidas por anúncios em redes sociais.
Assim como a publicações do grupo do facebook discutida aqui, há outros anúncios que tratam do uso do dióxido de cloro no tratamento de uma série de condições médicas, conforme na matéria do Portal Dráuzio Varella, a substância estava também sendo comercializada ilegalmente para o transtorno do espectro autista.
– O que a OMS e entidades médicas falam do uso de MMS? Em março, a Associação Brasileira de Centros de Informação e Assistência Toxicológica e Toxicologistas Clínicos (ABRACIT) publicou nota posicionando-se contra o uso da substância, além da administração inconsequente:
Em relação ao uso de produtos químicos, chegou ao nosso conhecimento que pessoas estão ingerindo um produto denominado de “MMS” (do inglês Miracle Mineral Solution) para a cura e/ou prevenção da COVID-19. Consiste em um kit composto de um frasco de clorito de sódio a 28% e um frasco com ativador à base de ácido clorídrico a 4%, ambos tóxicos à saúde humana, produzido para o tratamento e desinfecção de água, mas comercializado ilegalmente como remédio para tratamento da doença provocada pelo coronavírus. Este mesmo produto já foi comercializado no passado com a promessa de cura do autismo e do câncer, tendo a sua comercialização proibida desde 2018 no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
O clorito de sódio é um forte agente oxidante e pode ter efeitos corrosivos na pele, olhos, sistema respiratório, mucosa oral e trato gastrointestinal, podendo causar ainda efeitos sistêmicos, incluindo cianose, metahemoglobinemia e insuficiência renal. O seu manuseio e aplicação como desinfetante deve ser feito utilizando-se os equipamentos de proteção individual (EPI) recomendados como óculos de proteção, luvas e roupa em PVC. O ácido clorídrico, por sua vez, pode causar dor imediata com queimação na boca, garganta e estômago, dor abdominal, vômito e dificuldade em respirar, quando ingerido, além de queimadura na pele e complicações respiratórias. O seu manuseio também deve ser feito com uso de EPI.
A nota na íntegra pode ser acessada aqui.
Quanto ao posicionamento da OMS, a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) emitiu um alerta em agosto contra o uso de produtos com cloro para tratamento de pacientes com COVID-19.
“A OPAS não recomenda o uso oral ou parenteral – intravenosa, intra-arterial, intramuscular e subcutânea – de dióxido de cloro ou produtos com clorito de sódio para pacientes com suspeita ou diagnóstico de COVID-19 ou para qualquer outra pessoa. Não há evidências de sua eficácia e a ingestão ou inalação de tais produtos pode causar graves efeitos adversos”, alertou o documento.
A OPAS recomenda ainda que a população evite consumir produtos que contenham dióxido de cloro ou substâncias relacionadas (hipoclorito de sódio e alvejante, por exemplo) e que toda a comercialização desses produtos para fins terapêuticos seja notificada às autoridades.
O comunicado da OPAS na íntegra pode ser acessado aqui.