É verdade que conselho de pesquisa indiano indica uso preventivo de hidroxicloroquina, mas há ressalvas; entenda o caso
Uma publicação no Instagram afirma, entre outras coisas, que “na Índia estudos apontam que uso precoce de hidroxicloroquina é responsável por redução de cerca de 80% nas chances de infecção por coronavírus em profissionais de saúde” (veja acima).
O material foi enviado para o aplicativo o aplicativo “Eu Fiscalizo” da Fiocruz (disponível para Android e iOS). O Nujoc Checagem é um site parceiro da iniciativa, checando denúncias que são recebidas na plataforma.
Não identificamos, no documento com data de 22 de maio de 2020, que apresenta o parecer do Conselho Indiano de Pesquisa Médica (ICMR), nenhum trecho que comprove essa afirmação. O documento fala sobre redução na infecção, mas não mostra a taxa. Vale lembrar, ainda, que as recomendações são para profissionais que estão na linha de frente no combate à Covid-19. Assim, o documento apresenta uma avaliação feita com 1.323 profissionais de saúde e as recomendações são feitas a um público-alvo bastante específico, que compreende:
1. Todos os profissionais de saúde assintomáticos envolvidos na contenção e tratamento de Covid-19 e profissionais de saúde assintomáticos que trabalham em hospitais não-Covid/áreas não-Covid de hospitais/blocos Covid.
2. Trabalhadores da linha de frente assintomáticos, como vigilantes posicionados em zonas de contenção e pessoal paramilitar/policial envolvido em atividades relacionadas ao Covid-19.
3. Contatos domésticos assintomáticos de casos confirmados em laboratório.
O medicamento é contraindicado para pessoas com retinopatia, hipersensibilidade aos compostos HCQ ou 4-aminoquinolina, deficiência de G6PD, cardiomiopatia pré-existente e distúrbios do ritmo cardíaco, bem como pessoas menores de 15 anos, grávidas e lactantes. Ainda de acordo com o documento, dentre os 1.323 profissionais tomaram a hidroxicloroquina houve efeitos colaterais como náusea em 8,9% dos casos, dor abdominal (7,3%), vômitos (1,5%), hipoglicemia (1,7%) e efeitos cardiovasculares (1,9%).
Segundo esta publicação do site IstoÉ, a Índia responde por 70% da produção global da hidroxicloroquina. Ao final do documento, o Conselho alerta ainda que o uso da hidroxicloroquina como medida profilática não deve dar uma falsa sensação de segurança a quem o ingere.
Veja o documento na íntegra aqui.
——
Entenda o cenário
A cloroquina, e a hidroxicloroquina (substância derivada), são amplamente defendidas pelo governo federal como a melhor resposta no combate à Covid-19, provocada pelo vírus Sars-Cov-2 (novo coronavírus). O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou a jornalistas, em meados de maio, que está fazendo uso da hidroxicloroquina como medida profilática.
Esse tipo de relato, assim como a permissão de uso para os médicos feita pelo governo indiano, abre um precedente perigoso: muitas pessoas sentem-se autorizadas a fazer o mesmo. Por isso, não é incomum esse tipo de publicação incentivando práticas que podem ser muito nocivas à saúde. A própria FDA (Food and Drug Administration), agência reguladora de medicamentos e alimentos dos EUA, adverte para o risco de problemas cardíacos. Falamos disso nesta checagem. E o órgão não é o único: pesquisadores, profissionais da saúde e outros especialistas alertam para os perigos do uso fora do ambiente hospitalar.
Na semana passada, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decidiu interromper os testes com a hidroxicloroquina após ser divulgado um estudo na revista The Lancet, que não recomendava o uso da hidroxicloroquina no tratamento da doença, pois segundo a publicação não seria eficiente no combate à Covid-19 e poderia levar à arritmia cardíaca.
Na última quarta-feira (3), a entidade anunciou que retomaria os testes com a substância, já que o comitê executivo da OMS não encontrou evidências de que a hidroxicloroquina seria responsável pelo aumento de mortes dos pacientes tratados.
A verdade é que, mesmo com estudos realizados por pesquisadores de todo o mundo, ainda não há um parecer conclusivo sobre a eficácia sem deixar sequelas naqueles que são tratados com essa classe de medicamentos.