Fake Science: a invasão
Por Ana Regina Rêgo
A pseudociência tem uma trajetória atrelada ao negacionismo científico e a partir do pós-Segunda guerra mundial se transformou em estratégia política e mercadológica, não somente para distintas visões de mundo e desejos de futuro, mas, muitas vezes de genocídio dos pobres e vulneráveis, em prol do lucro e da dominação, como vivenciamos nos dias atuais no Brasil e em muitos países mundo à fora.
A fake Science que compõe o fenômeno da desinformação, compõe hoje, assim como, as fake News, uma categoria complexa que termina por conformar diversos tipos de narrativas que se consolidam através de distintas estratégias de atuação, ganho de visibilidade e credibilidade.
A fake Science também conhecida como pseudociência, não se compõe, portanto, somente de fraudes, ao contrário, se ancora nos processos e métodos científicos, com o intuito de contrapor a ciência, o que tem levado, não somente o público leigo a acreditar em pesquisas falsas amplamente divulgadas, por exemplo, neste momento de pandemia, como também tem levado profissionais de áreas vinculadas às ciências da vida, como a medicina, a aderir a tais discursos falsos.
As publicações científicas qualificadas como fontes credíveis são alvos de falsificações que procuram exatamente agregar valor positivo guardado nas revistas científicas. Nesse caso específico, pesquisadores falsos ou não, mas que tem como intuito contrapor a ciência e negá-la, expõem a utilização de métodos científicos, enquanto manipulam dados e resultados. Essa prática tem se tornado corriqueira desde que há cerca de 40 anos a indústria do tabaco cooptou cientistas aposentados para criar um manual com estratégias de atuação que objetivavam contrapor as evidências da ciência em relação aos malefícios do cigarro, notadamente, como causador do câncer. Dentre as estratégias estavam tanto a invasão da pseudociência no campo científico, com publicações manipuladas ou falsas, além de intervenção no processo educacional e ocupação dos espaços midiáticos. Cartilha muito parecida com a cartilha utilizada no campo político desde Goebbels, guardadas as devidas proporções.
Desde então é possível visualizar sites que tanto publicam pesquisas verdadeiras com dados manipulados, como sites falsos que são réplicas da ONU ou da Unesco, ou, do Instituto Mundial de monitoramento do clima, dificultando o olhar do leigo para o que é de fato um site verdadeiro ou não. Para além disso, pesquisas fakes terminam sendo publicadas em revistas consolidadas e presentes em bases credíveis como a Web of Science levantando dúvidas, inclusive, na sociedade científica. Vale lembrar que a dúvida é tanto a base da ciência, visto que impulsiona a pesquisa e alavanca a produção de conhecimento, como também é a geradora do negacionismo e do desentendimento.
Inúmeros exemplos de desinformação científica podem ser localizadas ao longo do século XX, contudo, é o momento pandêmico atual que tem potencializado a produção da pseudociência.
Em 2006 o cientista sul coreano Woo Suk-Hwang foi desmascarado em uma pesquisa em que divulgava que havia conseguido a clonagem humana, contudo, era tão somente uma fraude.
Em 2018 a revista Neuroquantology publicou o artigo “Modificações do DNA através de intenções remotas”. Os autores, no artigo em pauta, afirmam analisar os dados de modo estatístico e aplicar o rigor acadêmico e científico, contudo, o experimento em si, é potencialmente uma fraude, visto que as mutações no DNA não acontecem por manipulação da mente de modo remoto.
Em 2020 e 2021 vivenciamos uma verdadeira batalha entre os regimes de verdade da ciência (evidência) e de muitos médicos (experiência) disputando a verdade sobre tratamento precoce com kit Covid-19, o que levou a inúmeras publicações controversas, além de publicações manipuladas como as que circularam recentemente e tinham como referente a pesquisa de Oxford sobre Ivermectina, que no Brasil foi modificada e tratada de muitos modos, objetivando manipular a audiência. Por último, o próprio Ministério da Saúde do Brasil publicou nota oficial atestando a ineficácia dos medicamentos que compuseram o kit Covid para tratar o novo coronavírus.
Por outro lado, atualmente, personagens da ciência e da medicina se colocam no mercado da desinformação como dotados de credibilidade, visto sua aderência ao campo científico, contudo, como vimos nos dias atuais, muitos tão somente atuam para disseminar informações falsas ou distorcidas que podem, inclusive, prejudicar a saúde do povo, como no caso do meio milhão de brasileiros mortos por Covid-19.
Alguns desses “médicos” ou “enfermeiros” possuem canais monetizados nas plataformas digitais e os que possuem um bom número de seguidores terminam por ganhar muito dinheiro com a desinformação, hoje, um produto com grande potência mercadológica.
Nesse cenário, a desinformação na ciência tem levado a uma potencialização do negacionismo científico e que tem, nesse momento, um grande e poderoso aliado que é o movimento antivacina, cuja produção diária de narrativas desinformacionais que circulam pelas diversas plataformas digitais e chegam até as pessoas através dos grupos de distribuição de igrejas, famílias e amigos dos aplicativos de mensagem, ou, por meio de redes sociais, têm provocado um grande estrago entre brasileiros e norte-americanos, mas a situação não é distinta na Índia ou em países da África.
No caso brasileiro, estão agindo diretamente no descrédito das vacinas, como a Coronavac, por exemplo, que tem sofrido ataques diários, mas as demais vacinas também não passam despercebidas, muitas são acusadas de instalar chips 5g ou de causar a morte em poucos anos.
Essa invasão de desinformação tem levado brasileiros de todas as regiões e um grande número de indígenas à morte, pois as fake News sobre vacinas, se aliam à desinformação sobre o uso das máscaras de distanciamento social, compondo uma arquitetura da morte planejada e programada.
VACINA JÁ PARA TODOS! USE MÁSCARA! NÃO AGLOMERE!