Os vários lados da desinformação
Artigo de Ana Regina Rêgo
Estudo publicado no início de abril pelo Reuters Institute em parceria com a University of Oxford sobre a circulação de narrativas atualmente classificadas como desinformacionais traz resultados interessantes sobre as características que conformam o mercado da desinformação no Reino Unido.
Os pesquisadores Dr.J. Scott Brennen, Felix Simon, Dr. Philip N. Howard e o Professor Rasmus Kleis Nielsen analisaram 225 informações com algum problema de conteúdo e que foram classificadas como falsas ou enganosas por sites de verificação e publicadas em inglês entre os meses de janeiro a março de 2020. Toda a amostra foi coletada no site First Draft, site inglês que facilita o trabalho dos jornalistas com publicação de informações verificadas, pesquisa e divulgação de informações de qualidade. Para conhecer o First Draft acesse https://firstdraftnews.org/.
A pesquisa foi motivada pelo crescente número de informações falsas ou manipuladas que passaram a circular na sociedade, tendo como temática a COVID 19 e os temas correlatos.
É de domínio público que as denominadas fake News, assim como, as narrativas distorcidas e descontextualizadas sempre existiram em diversas áreas, no entanto foram potencializadas pelas possiblidades da tecnologia digital. Nos últimos anos, o movimento negacionista tem ganho espaço ao distorcer informações sobre a ciência, a saúde, a tecnologia e a história, ao tempo em que procura desqualificar o jornalismo.
No contexto da pandemia que ora vivemos, jornalistas, cientistas da comunicação, formuladores de políticas de comunicação e acadêmicos terminaram por formar em todo o mundo, um movimento que, embora disperso em inúmeros países, universidades e empresas, chegou até a Organização Mundial de Saúde – OMS fazendo-a perceber que a desinfopandemia sobre a COVID 19 representa um risco à saúde pública e a própria atuação dos profissionais e órgãos de saúde.
Esse movimento fez com que a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura-UNESCO realizasse a pesquisa Desinfopandemic em parceria com o International Center for Journalism-ICFJ, assim como, a Organização das Nações Unidas-ONU lançasse a iniciativa Verificado com o objetivo de combater as informações falsas.
De acordo com os pesquisadores, “Cristina Tardáguila, Diretora Associada da Rede Internacional de Verificação de Fatos (IFCN), chamou a COVID-19 de “o maior desafio que os verificadores de fatos já enfrentaram” para combater conteúdo potencialmente prejudicial”.
O estudo inglês intitulado: Tipos, fontes e reivindicações de desinformação da COVID-19 e que está disponível no endereço: https://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/types-sources-and-claims-covid-19-misinformation chegou a 5 principais conclusões, a saber:
Em primeiro lugar destaca que em termos de escala, o número de verificações de informações consideradas suspeitas cresceu cerca de 900% nos meses analisados, ou seja, de janeiro a março de 2020. Nesse ponto, os pesquisadores enfatizam que considerando que os sites de checagem possuem recursos escassos e não tem condições de verificar tudo o que aparece, acredita-se que o volume total de fabricação de informações errôneas ou mentirosas sobre o novo coronavírus seja bem superior.
Sobre os formatos: os pesquisadores detectaram que a maioria das informações verificadas, ou seja, 59% eram informações reconfiguradas, partiam de uma narrativa existente sobre algum fato verdadeiro e que eram distorcidas, recontextualizadas ou retrabalhadas. Enquanto que cerca de 38% eram completamente fabricadas, logo mentirosas em 100% do seu conteúdo.
No entanto os autores da investigação científica aqui pauta afirmam que: “apesar de muita preocupação recente, não encontramos exemplos de falsificações profundas em nossa amostra. Em vez disso, o conteúdo manipulado inclui ‘falsificações baratas’ produzidas usando ferramentas muito mais simples. A desinformação reconfigurada é responsável por 87% das interações de mídia social na amostra; enquanto que o conteúdo fabricado somente por 12% “.
Já no que concerne às fontes de desinformação, a análise do fluxo vertical de cima para baixo, envolvendo políticos, celebridades e outras figuras públicas, mostrou que esses personagens são responsáveis por cerca de 20% das informações problemáticas no Reino Unido, entretanto o risco é muito maior, visto que representam 69% do engajamento em mídias sociais. Enquanto que o restante das fake News representam um envolvimento muito menor.
Todavia, em alguns casos o fluxo se inverte e em algumas instâncias da desinformação alcançam grande engajamento, mesmo saindo de baixo para cima. Vale destacar que a análise não conseguiu capturar a propagação de informações falsas em grupos privados que circulam em aplicativos de mensagens, onde se acredita que haja um fluxo significativo de desinformação de baixo para cima.
A quarta conclusão se refere às reivindicações, reivindicações enganosas ou falsas sobre as ações ou políticas de autoridades públicas, incluindo órgãos governamentais e internacionais como a OMS ou a ONU, que configuram a maior categoria de reivindicações identificadas, aparecendo em aproximadamente 39% da amostra.
Por último, trabalhou-se as respostas que as plataformas digitais internacionais deram à maioria das postagens classificadas pelos sites e institutos de checagem como falsas, imprecisas ou manipuladas, em seus ambientes, removendo ou colocando avisos sobre o perigo da informação.
No Twitter, 59% das postagens classificadas como falsas em nossa amostra por verificadores de fatos permanecem em alta. No YouTube, 27% permanecem ativos e no Facebook, 24% do conteúdo com classificação falsa em nossa amostra permanece ativo sem rótulos de aviso. Ou seja, esses resultados confirmam a necessidade de regulação das plataformas digitais internacionais a fim de que venham a cumprir a legislação de cada país.