YOUTUBE: repositório da desinformação
Por Ana Regina Rêgo
O grande volume de vídeos que contém desinformação e que se alojam nos mais diversos tipos de canais do YouTube, configurando esta plataforma como um grande repositório de desinformação; tem levado os gestores do YouTube, diante da pressão social e das consequências, muitas vezes, devastadoras das informações falsas, a aprimorar seus compromissos e sua política de combate à desinformação.
No link compromissos, o YouTube se compromete a combater a desinformação na plataforma usando os princípios do que denomina de 4 Rs, a saber: Recompensas para criadores confiáveis, Remover conteúdo que viola as políticas internas, Reduzir as recomendações de vídeos duvidosos e Recomendar fontes confiáveis de notícias e informações ( Para ler mais acesse: https://www.youtube.com/intl/ALL_br/howyoutubeworks/our-commitments/fighting-misinformation/ ).
Recentemente uma pesquisa do Centro de Mídia Social e Política da New York University (https://csmapnyu.org/ ) sobre mudanças na política do YouTube contra a desinformação eleitoral aplicada em 2020, revelou que a nova política provocou um efeito cascata e terminou diminuindo também a incidência e a circulação de vídeos com conteúdos falsos e enganosos nas plataformas Facebook e Twitter, durante o pleito para presidência dos Estados Unidos ano passado.
A pesquisa divulgada em matéria do New York Times pela jornalista Davey Alba no dia 14 de outubro e intitulada YouTube’s election misinformation policies had a spillover effect on Twitter and Facebook ou Políticas eleitorais de combate à desinformação mais fortes no YouTube tiveram efeito de contágio no Twitter e no Facebook (https://www.nytimes.com/2021/10/14/technology/distortions-youtube-policies.html ) esclarece que tal fenômeno aconteceu, principalmente, tendo em vista que os vídeos do YouTube são facilmente compartilhados em qualquer outra plataforma e aplicativos de mensagem, o que transforma os produtos do YouTube em produtos multiplataformas e de fácil difusão.
Nesse sentido, uma vez removidos na plataforma original, os vídeos desaparecem das demais plataformas em que circularam e/ou foram compartilhados.
O estudo enfatiza que após o dia 03 de novembro de 2020, quando ocorreram as eleições, houve um aumento no número de vídeos que traziam algum tipo de narrativa falsa sobre fraudes eleitorais. No dia 08 de dezembro, o YouTube anunciou que iria remover vídeos que abordassem a teoria das fraudes nas eleições presidenciais, tendo realizado tal remoção logo em seguida. Em 21 de dezembro, os pesquisadores detectaram uma grande redução no número de vídeos com desinformação abordando as fraudes eleitorais, tanto no YouTube como no que seria compartilhado em outras plataformas.
Todavia, os esforços da plataforma parecem não refletir a tempo de impedir que muitas consequências danosas da desinformação prejudiquem a sociedade. Existem inúmeras pesquisas, já abordadas aqui nesta coluna, que enfatizam o potencial de circulação das fake News que é 70% maior do que o de uma informação, por outro lado, existe outro grande número de pesquisas que revelam as estratégias de negócios das plataformas que terminam lucrando de modo exponencial com o produto “desinformação” e, embora, este não seja o principal objetivo, muito menos, produto de interesse, o modo como os usuários se comportam diante das narrativas que ganham maior visibilidade e relevância no contexto digital, como as narrativas que contém desinformação, termina alimentando o capital de predição que é o maior interesse e o maior capital das plataformas digitais, a saber: nosso comportamento imediato que revela nosso comportamento futuro em relação a tudo o que nos interessa e que é revelado no modo como nos movemos e nos comportamos nas redes. Esse capital é vendido a preço de ouro ao mercado e serve para inúmeras estratégias, inclusive, de modo mais simplório, para nos ofertar produtos e serviços a todo e qualquer momento.
Recentemente vimos a plataforma do YouTube remover inúmeros vídeos que abordam temáticas antivacina, inclusive, live do Presidente Jair Bolsonaro, reforçando sua política de banimento de conteúdo no que concerne também a este tema. Tais remoções trazem benefícios porque limitam a circulação desses conteúdos, mas não são suficientes e ainda são carregadas de contradições. Se por um lado, o aprimoramento das políticas somente acontece quando os conteúdos já se tornaram prejudiciais e ganharam relevância em manifestações sociais, essas políticas terminam não contemplando um grande número de narrativas que também carregam desinformação e que oscilam em milhares de outras temáticas, desde as negacionistas da ciência, terraplanistas, conteúdos que contém fraudes direcionadas a golpes financeiros, as mentiras sobre a história, a desinformação religiosa, etc.
Por outro lado, até o presente momento as plataformas praticam uma autorregularão e decidem o que deve permanecer e o que não deve permanecer no universo online. Por outro lado, limitam a visibilidade de conteúdos que em tese, seriam somente conteúdos duvidosos, mas essa limitação termina abrangendo outros conteúdos que não se adequam as programações das plataformas, tanto no que se refere às estratégias de marketing, como no que se refere a nomenclaturas aparentemente bloqueadas ou proibidas pelo código de cada rede.
Nesse sentido, para cada vídeo de desinformação que já atingiu milhões e milhões de usuários/inscritos/seguidores que é derrubado por uma plataforma, existem milhões e milhões de vídeos com informação qualificada que não conseguem ter visibilidade alguma nas redes, visto que disputam a atenção dentro de um cenário predatório e regulado pelas plataformas, que privilegiam o que pode lhes dar maior retorno de capital, principalmente, capital de predição.
Logo podemos até comemorar as migalhas que o YouTube parece ofertar em termos de uma política mais ética de banimento de material desinformacional, mas é preciso estar muito atento, porque o modo como realizam a gestão das redes faz de nós usuários, inscritos, seguidores, produtos depenáveis. De nós, nada fica, extraem tudo o que podem e ainda tem o poder de dizer quem, quando e onde pode falar, e, se, ao falar, pode alcançar um público razoável para tentar intervir no cenário informacional extremamente competitivo.
Sigamos de olho no Projeto de Lei 2630/2020 conhecido como PL das Fakes News, mas que aborda também a regulação das plataformas e que possui pontos complexos de inflexão que se não forem bem trabalhados podem prejudicar a sociedade, de lado empoderando ainda mais as plataformas, ou, dando poderes de censura ao Estado. Fiquemos atentos!